Chegada do futebol no Brasil é refém da documentação e da falta dela

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Por Sandrielly Santos – Internacionalista
A profissionalização do futebol passa por contrato assinado, campeonatos bem-organizados, torcida presente nos jogos e remuneração decente, mas também pela memória de quem o praticou antes.
A chegada do futebol no Brasil é refém da documentação e da falta dela. Conhecemos nomes e datas sobre os responsáveis por trazerem o esporte ao país porque em algum momento pesquisadores documentaram aquilo que se passava. Aqueles que não fizeram parte desse processo, foram esquecidos. A memória coletiva sobre o futebol brasileiro é, na verdade, uma parte do que realmente foi, pois muitas histórias se perderam nesse caminho.
Trago esse debate para dizer que a construção do Brasil enquanto “País do Futebol” não inseriu nesse contexto as mulheres, pois até pouco depois do nosso tricampeonato mundial pela Seleção Brasileira de Futebol com os homens, elas estavam proibidas por lei de jogar (1941-1979).
Lógico, várias mulheres praticavam futebol clandestinamente e isso fez com que permanecessem com a bola no pé. No entanto, isso condenou o futebol de mulheres a um desenvolvimento tardio.
A regulamentação, isto é, a organização e permissão oficial para a prática do futebol feminino, incluindo a autorização para profissionalização nesse esporte só ocorreu em 1983. Dada a pressão de outras jogadoras no mundo todo, a FIFA passou a dar atenção e trazer a modalidade para si, obrigando países a se prepararem para uma futura Copa do Mundo Feminina. Em 1991, a estreia da competição marca na história que o futebol praticado por mulheres existe e persiste enquanto uma modalidade séria e que merece respeito.
Apesar da confusão entre a falta de vontade de instituições em profissionalizar mulheres e a obrigação de o fazer diante da pressão da FIFA, o futebol de mulheres foi sendo construído com muitos sacrifícios e força de vontade delas.
Em Sergipe, o principal campeonato é o Campeonato Sergipano Feminino. Criado em 2004 (porém sem edição uns e outros anos), é a chance de mulheres que aqui praticam o esporte tenham contato com uma versão institucionalizada do futebol, digamos assim. No entanto, o que sabemos sobre as primeiras participantes? As primeiras campeãs? Em tempos de baixo acesso à internet, alguém se deu ao trabalho de registrar essas mulheres?
O jornalismo sergipano não deu detalhes sobre essas jogadoras por muito tempo. Os pesquisadores e as instituições também não. Eu, enquanto iniciante nessa vida de pesquisadora, tenho encontrado dificuldades para acessar informações. O que mais me entristece nessa situação é que as jogadoras não têm o reconhecimento que merecem. Não falo necessariamente por títulos, mas pelo esforço que empregam, pelo investimento pessoal que fazem.
Queremos nomes, queremos saber quem são as jogadoras, as escalações, quem marcou os gols, queremos fotos estampadas nas notícias, queremos transmissão. Queremos condições de jogo decentes, campeonatos organizados. Elas merecem ter documentadas as suas participações. O futebol feminino merece também fazer parte da história sergipana.
Aproveito para parabenizar quem se esforça para divulgar os jogos e dar espaço de fala para as jogadoras. Vocês ajudam o futebol de mulheres a acontecer.



